ULTRA OPINIÃO

Zema: o CEO do caos
O presidenciável que governa um estado em frangalhos

O mineiro é mesmo um sujeito paciente. Aguenta trem atrasado, fila de banco, buraco em estrada, promessa de político. Agora, aguenta também ver o governador Romeu Zema surgir como “fenômeno eleitoral” em pesquisas presidenciais, enquanto o próprio quintal está em chamas.
A Quaest, em agosto, jogou confete: Zema venceria Lula em Minas no segundo turno por 47% a 34%. O Real Time Big Data deu 64% de aprovação. É quase como acreditar que o Cruzeiro vai ser campeão mundial: estatística pode até prometer, mas a realidade em campo é outra. Ops... brincadeiras à parte deste atleticano que vos fala...
Mas, falando sério, a realidade mineira é dura. Em maio, o governo decretou emergência por doenças respiratórias. Tradução: gente morrendo por falta de leito e respirador, crianças lotando pronto-atendimentos, idosos disputando vaga em UPA como se fosse ingresso de show. A fila por cirurgias eletivas em Belo Horizonte ultrapassou 29 mil pessoas. São milhares de mineiros à espera de uma cirurgia de hérnia, de vesícula, de catarata. A propaganda oficial, claro, veio com nome bonitinho: “Opera Mais Minas”. O problema é que slogan não corta apêndice, não drena abscesso e, definitivamente, não salva vidas.
Na educação, a tragédia repete o roteiro: salários achatados, salas lotadas, professores exaustos. Em abril, a categoria parou mais uma vez. O governo ofereceu reajuste simbólico e foi embora de fininho, como quem oferece um cafezinho frio numa negociação séria. Enquanto isso, nas salas de aula, estudantes do ensino médio aprendem a viver de improviso: falta professor de matemática? Vai com aplicativo. Falta professor de português?
A turma se vira no resumo. Mas na propaganda eleitoral, Minas é “referência em educação”. Deve ser, sim, referência em paciência.
E a segurança pública, então? A maior penitenciária do estado, a Nelson Hungria, segue parcialmente interditada por falta de servidores. Policiais penais ameaçam greve, denunciam déficit de efetivo e salários defasados. A resposta do governo? Sempre a mesma: “não há espaço para reajuste”. Talvez porque o espaço já esteja ocupado pelo marketing, que consome milhões para maquiar um caos que qualquer agente prisional, professor ou médico consegue descrever sem muito esforço.
O funcionalismo público mineiro, de resto, virou a vaca leiteira do “choque de gestão”. Salários corroídos, direitos congelados e promessas repetidas ad nauseam. Os sindicatos falam em maquiagem fiscal. O Sindpúblicos foi direto: “falta vontade política”. E falta mesmo. Mas sobra cara de pau para dizer que Minas é hoje um “exemplo de responsabilidade fiscal”.
É um exemplo, sim: de como sugar até o osso os trabalhadores que mantêm o estado de pé e ainda posar de gestor moderno.
E é nesse cenário que o governador surge como presidenciável competitivo. Curioso, não?
Minas vive um apagão nos serviços públicos, mas Zema brilha nas planilhas.
É como se o caos tivesse virado ativo eleitoral. O mineiro aperta a mão do vizinho na fila da UPA e comenta: “pelo menos a pesquisa tá boa, né?”. Ironia pouca é bobagem.
O “choque de gestão” de Zema virou, na prática, choque de ilusão. Um marketing tão bem embalado que convence parte do eleitorado de que o caos não existe. Minas, nesse sentido, é um laboratório: sucateia-se a saúde, a educação e a segurança, mas entrega-se um embrulho bem feito para o eleitor. O estado sangra, mas o governador sorri. É a política do delivery: a embalagem é premium, mas o conteúdo está estragado.
E agora, o Brasil corre o risco de importar o “modelo mineiro” em escala nacional. Afinal, se 64% aprovam, deve estar bom, não é? O detalhe é que essa aprovação vem de pesquisas, não de consultas na fila do SUS, nem de conversas com professores endividados, tampouco de policiais penais sem colete. É aprovação de quem acredita na vitrine, não de quem conhece o estoque.
Se esse é o cartão de visitas de Zema para a presidência, prepare-se, Brasil: o que Minas está vivendo hoje pode ser apenas a degustação de um banquete indigesto. Porque governar com planilha é fácil; difícil é governar com gente. E, até agora, Romeu Zema mostrou que sabe agradar às estatísticas, mas não sabe — ou não quer — agradar ao cidadão que sustenta o estado.
Minas não é vitrine, governador. Minas é o avesso da vitrine. E por trás do vidro polido do seu marketing, a realidade é feia, pesada e cruel. Mas quem liga para a realidade quando a pesquisa é boa?
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